Preconceito sm. 1. Ideia preconcebida. 2. Suspeita, intolerância, aversão a outras raças, credos, religiões, etc.
A definição dada pelo Dicionário Aurélio parece simplista ao primeiro olhar, mas as poucas palavras utilizadas são precisas, diretas e garantem um significado inequívoco para o termo. Olhos Azuis, oitavo longa-metragem de José Joffily, também possui essa rara qualidade e consegue transpor para a película, com exatidão, os sentimentos de quem um dia aprendeu o sentido do vocábulo sem ter que procurar no dicionário.
O ponto de partida para a análise que Joffily propõe parece ter saído de um filme de ação norte-americano, mas tiros e explosões são desnecessários aqui. Marshall (David Rasche), chefe do Departamento de Imigração do Aeroporto JFK, em Nova Iorque, celebra o último dia de trabalho, antes da aposentadoria forçada, incomodando um grupo de latino-americanos que ainda sonham com a terra prometida pelo Tio Sam. O incômodo que os latinos sofrem na sala de espera do aeroporto transcende a tela e recaí sobre os expectadores que, impassíveis como os personagens, compartilham das humilhações e agressões.
Para atingir esse estágio de interação com a platéia, José Joffily utiliza metáforas audiovisuais, um elenco forte e o recurso da montagem paralela. Vemos a trama ser revelada aos poucos, lentamente, passo a passo, enquanto nos aprofundamos na construção dos personagens. A montagem paralela nos leva a antever os acontecimentos e a julgar antes da hora, do mesmo modo que os oficiais da imigração fazem quando precisam decidir quem entra nos Estates e quem pega o avião de volta para seu país de origem.
A escolha por esse estilo de edição se mostra mais do que acertada, já que também permite aos atores coadjuvantes brilharem nos seus momentos em cena. Cada microuniverso que a narrativa constrói possui tensão e conflito na mesma escala da trama principal e esses elementos somados contribuem para a sensação de incômodo que atravessa a projeção do início ao fim.
O roteiro é dividido em camadas que apresentam duas realidades distintas, mas que irão percorrer caminhos paralelos até a inevitável fusão. A relação entre Marshall e o brasileiro Nonato, interpretado magistralmente por Irandhir Santos, é o fio condutor da história. Quando Marshall deixa de ser “O Chefe” para ser “O Gringo” a perspectiva muda e a relação dele com a prostituta Bia (Cristina Lago) estabelece uma segunda realidade no filme. A alternância entre essas duas realidades ora imprime um ritmo de road movie, ora de suspense impedindo que o expectador se acomode e evitando que o desfecho seja facilmente revelado.
Olhos Azuis foi o grande vencedor do Festival de Paulínia 2009 conquistando o troféu Menina de Ouro nas categorias de Melhor Filme, Melhor Roteiro, Melhor Montagem, Melhor Atriz (Cristina Lago), Melhor Ator Coadjuvante (Irandhir Santos) e Melhor Som. O desafio agora é conseguir ultrapassar as barreiras impostas por outra forma de preconceito.
O filme será lançado nesta sexta, 28 de maio, e dividirá as salas de cinema com os blockbusters do verão norte-americano. A invasão dos ‘olhos azuis’ em terras tupiniquins começou com Homem de Ferro 2, Robin Hood, Fúria de Titãs e na próxima semana teremos a estréia de Príncipe da Pérsia – adaptação do famoso joguinho da década de 80. Não seria o caso de utilizarmos o mesmo discurso de qualquer fiscal da alfândega norte-americana: “Vocês entram aqui, pegam nossos empregos, ganham dinheiro, mandam para seus países e nós, como ficamos?”
Sem apelar para o nacionalismo exacerbado podemos dizer que nós temos escolhas e uma delas é ver o ótimo trabalho de José Joffily na tela grande. Não deixe para ver em DVD. A elaborada fotografia de Nonato Estrela e a inquietante trilha sonora de Jaques Morelenbaum esperam por você.
Olhos Azuis (Blue eyes)
Brasil, 2009. 111 minutos
Direção: José Joffily
Elenco: David Rasche, Irandhir Santos e Cristina Lago
Tags: Aeroporto JFK, Christian Jafas, Cristina Lago, David Rasche, Fúria de Titãs, Homem de Ferro 2, imigração, Irandhir Santos, Jaques Morelenbaum, José Joffily, montagem paralela, Nonato Estrela, Nova Iorque, Olhos Azuis, Príncipe da Pérsia, preconceito, Robin Hood, Tio Sam
09/10/2013 às 16:08 |
Filme sensacional, mostrou três lados da mesma situação, é para refletir e mudar urgente muitos paradigmas.
27/09/2014 às 10:52 |
Verdade Marlene.