Homem de Ferro (Iron Man, 2008) foi o primeiro filme produzido pelo selo Marvel Studios e com controle total da empresa de quadrinhos. Sem a pressão dos grandes estúdios e a incômoda interferência dos chefões de Hollywood nos sets, a Marvel não tinha mais desculpas para um possível fracasso.
Livre dos produtores tradicionais, a equipe de criação da Casa das Ideias, Avi Arad, Kevin Feige e Stan Lee, pôde finalmente escolher roteiro, elenco e diretor que se encaixassem perfeitamente no estilo de cada personagem que seria levado para as telas. E as escolhas se mostraram acertadas quando analisamos a adaptação de Homem de Ferro para o cinema.
O milionário Tony Stark, criação inspirada em Howard Hughes, era tudo o que Robert Downey Jr. precisava para voltar ao topo da indústria cinematográfica. Depois de cair na lista negra dos estúdios por seu envolvimento com drogas e álcool, poucos apostariam em seu retorno e ninguém estava disposto a incluí-lo numa superprodução.
O diretor Jon Favreau pensava em usar um ator desconhecido para o papel, mas decidiu dar uma chance a Downey, fã do personagem, e que seria capaz de criar um “canalha simpático”. Grande acerto de Favreau e um raro momento de união entre ator e personagem.
A chatinha Gwyneth Paltrow e o engraçado Terrence Howard são os coadjuvantes perfeitos para o brilho de Robert Downey Jr. Já o sempre correto Jeff Bridges consegue transformar um raso antagonista num vilão cínico e espirituoso. A cena da coletiva de imprensa onde Obadiah Stane pede um hamburger a Tony Stark é hilária e parece ter sido criada pelos atores.
Os melhores momentos do filme ficam por conta do excelente desempenho de Downey e do afiado texto que consegue aproveitar a veia cômica do ator que já viveu Charles Chaplin nos cinemas na aclamada produção Chaplin (1992) que lhe rendeu a indicação ao Oscar de Melhor Ator.
O Homem de Ferro só aparece com 35 minutos de projeção e antes disso nos divertimos com as sacadas sem noção de Tony Stark, um alterego tão interessante quanto o herói de armadura. Prova que um bom roteiro e uma boa história ainda são mais importantes que os shows de efeitos especiais.
Um erro normalmente cometido em filmes de ação, o excesso de efeitos, é evitado pela direção segura de Jon Favreau e a perspicácia dos homens da Marvel que sabem que seus personagens são fortes o suficiente para não serem ofuscados por explosões e pirotecnia desnecessária. Os efeitos visuais são usados para tornar verossímeis os sonhos de Stan Lee e Jack Kirby, criadores do herói, mas nunca chegam a roubar a cena. O que pode parecer contraditório, mas não é.
Um filme de ação não precisa mais só ter tiros, câmeras tortas, montagem acelerada e todo o pacote dos filmes dos anos 80 e 90. Uma nova geração de cineastas – e de público – diminuiu o ritmo frenético da Era Rambo permitindo que o enredo e diálogo tenham um espaço maior entre os corpos caindo do telhado.
Claro que seria impensável realizar o filme na década de 90, pois os recursos tecnológicos da época não seriam capazes de proporcionar as cenas de combate, impressionantes, e as simulações do computador J.A.V.I.S., dublado por Paul Bettany, que dão o toque futurista pedido pelo roteiro. Aliás, as brincadeiras entre Stark e os robôs do laboratório funcionam como alívio cômico e uma forma de introduzir a tecnologia ao longo do filme.
A história atualizada tira o personagem do conflito no Vietnã e o leva para o Afeganistão. Nada que afete a cronologia do herói, já que guerras sem fundamento não faltam para os norte-americanos. Os árabes, inimigos da vez, não podiam ficar de fora e a era do politicamente correto obriga a produção a usar os árabes-bons e os árabes-maus.
Típico do cinismo norte-americano que mesmo tentando fazer um filme para o mundo não consegue deixar de ser o guardião da moral e dos bons costumes. Um efeito colateral que não chega a prejudicar a diversão. E o que é Homem de Ferro senão simples diversão?
Homem de Ferro (Iron Man)
EUA, 2008, 126 min
Direção: Jon Favreau
Elenco: Jeff Bridges, Gwyneth Paltrow e Terrence Howard